O BLOG DO AVESSO E DO DIREITO
Nós os conhecemos como meninos levados;
no Rio
de Janeiro, apreciam bombons e fazem
brincadeiras infantis;
na Bahia, esbaldam-se nas comidas que
lhes são
dedicadas e cobram total carinho e
atenção de seus fiéis,
que são inúmeros. No dia de sua festa,
27 de setembro,
no meio da comilança e das danças,
agarram no seu cavalo
(filho ou filha de santo que “incorpora”
a entidade)
e fazem brincadeiras com os presentes,
devotos ou não,
falando o tatibitate infantil e se
lambuzando (e lambuzando
os outros) de cocada puxa, rapadura ou
caruru.
São danadinhos, mas não deixam seus
devotos na mão.
Pediu, recebeu.
Estudando o passado para saber de onde
vieram e
como começou a tradição, descobri que
foram médicos
caridosos e dedicados que cuidavam dos
pobres e desvalidos;
irmãos no sangue, ligados pelo saber,
fazendo o
bem sem olhar a quem.
Quando os remédios faltavam, recorriam
à oração
e benziam a água, que se transformava
em remédio miraculoso.
Eles trabalhavam em prol da humanidade,
por
amor. Por isso eram chamados “os anargiros”, ou seja,a
inimigos do dinheiro, epíteto que, de
jeito nenhum,
se aplicaria aos médicos de hoje, nem
aos planos de
saúde.
Eu os imagino jovens e bonitos,
morenos, pois tinham
origem árabe, indo de casa em casa,
fizesse sol ou
chuva, a sangrar, pensar, receitar,
consolar e aconselhar.
Vislumbro a alegria que essa gente
desassistida devia ter
ao vê-los chegar.
Entregue a essa visão, ouço uma voz lá
longe gritar:
Missa pedida pra São Cosme e São
Damião!
E alguém respondeu:
– Eles mesmo que nos ajudem.
Na Bahia, os médicos abnegados foram
substituídos
pela negra carregando uma caixinha de
papelão
mal ajambrada, com pequenas imagens de
argila metidas
no fundo, rodeadas por um monte de
manjericão,
melindre, malmequeres, misturados com
papel de seda
cortado.
Como boa baiana, deposito minha
moedinha na
caixa, mas converso com meus botões: –
Pra que santo
quer dinheiro? Eles têm tudo!
Quem pediu a moeda explica que é
promessa; o
santo lhe valeu, tem que pagar o
prometido: missa e
caruru. Como é pobre, pede para poder
cumprir o prometido.
– E eu com isso? Quem pariu Mateus que
balance...
Seria fazer cortesia com chapéu alheio.
A desculpa é que é um preceito, é assim
desde que
o mundo é mundo. Vá lá! Embora tenha
malandro que
peça para a “caninha”, o santo não vê
nem o cheiro da
oferenda. Muitos cantam assim:
São Cosme e São Damião
Fizeram combinação
Saírem pedindo esmola,
Para fazerem um pirão.
O certo é que na Bahia são adorados,
inclusive por
mim, que tenho um filho de setembro e
netos gêmeos.
Meu caruru, com tudo o que tem direito,
não deixo de
oferecer. Promessa é dívida.
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